segunda-feira, 5 de fevereiro de 2018

Afigurações nabantinas

A recente publicação do ranking 2017 das escolas portuguesas permite constatar que, em pelo menos um caso, não são só os políticos locais que embelezam a sombria realidade. Também alguns docentes se têm mostrado demasiado generosos na atribuição de notas. Por isso a crónica anterior termina com uma referência ao adágio segundo o qual não se podem fazer chouriços sem carne, mas há quem vá tentando.
Em estilo mais directo, de acordo com os dados oficiais publicados, há escolas cujos professores são mais benevolentes, ou menos exigentes, do que noutras. Ora faça favor de ler atentamente este quadro, no qual Tomar aparece finalmente à cabeça, mas infelizmente não por boa razão:

Intervalo entre a média dos resultados dos exames e a média das avaliações internas

Concelho e ranking    Escola     Média dos exames  Média interna  Intervalo   Intervalo médio

 1º - TOMAR

253º - E.S. Jácome Ratton                 10,70                    13,39           2,69
289º   E.S. S. M. Olival                       10,51                    14,36          3,85   (2,69+3,85) 3,27

2º - ABRANTES

186º - E.S. M. Fernandes                  10,99                   13,68             2,69
335º - E.S. S. Abreu                          10,33                   13,36             3,03                      2,86

3º -  SANTARÉM

130º - E.S. G. Machado                   11,51                    13,99              2,48
158º - E.S. Sá da Bandeira              11,15                    13,95              2,80                     2,64

4º - TORRES NOVAS

92º - E.S. A. Gonçalves                   11,59                    13,97              2,38
112º - E.S. Maria Lamas                  11,09                    13,48              2,39                   2, 39

5º - OURÉM

29º - Colégio S. Miguel                   12,83                   14,49               1,66
86º - Centro Estudos Fátima           11,64                   13,74               2,10
161º - E.S. Ourém                           11,13                   14,06               2,93                   2,23

6º - LEIRIA

39º - Col. Pereira da Costa           12,43                     13,58                1,15
42º - E.S. da Maceira                    12,38                     14,18                1,80
96º - E.S. Domingos Sequeira      11,57                     13,90                2,33
141º - E. S. R. Lobo                      11,28                      13,56               2,28
280º - E.S: Lopes Vieira               10,58                      13,38               2,80                 2,07

Temos assim que, quanto ao intervalo entre a média dos exames e a das classificações internas, Tomar ocupa em 2017 o primeiro lugar destacado entre os seis concelhos considerados, graças aos 3,85 da Escola Secundária Santa Maria do Olival. Poderá dizer-se que é um detalhe sem grande importância. Talvez seja. Mas numa escala de zero a cem, corresponde a um fosso de 19,25 pontos percentuais. Convirá por isso considerar igualmente que esse intervalo entre as notas dos exames e as internas diminui na razão inversa da situação sócio-económica do concelho. Tomar e Abrantes, onde a crise é evidente, aparecem à cabeça, enquanto Leiria e Ourém, que crescem a olhos vistos, ocupam os últimos lugares.
A generosidade, ou menor exigência dos professores, tende a aumentar em função do nível geral das turmas que lhes couberem. É humano. Inflacionar classificações evita problemas com alunos e famílias, contribuindo para encorajar os discentes e melhorar a auto-estima dos docentes. Infelizmente, tal prática, conhecida como inflação de notas, acarreta também vários inconvenientes. Designadamente o de inculcar nos alunos a ideia de que são bons, o que por vezes não é o caso, levando-os posteriormente a criticar professores mais exigentes e a atribuir à má sorte os sucessivos maus resultados conseguidos. Acontece aquilo que um conhecido provérbio resume lapidarmente: "O mau dançarino diz sempre que o sobrado é torto".
Os mais interessados nestas coisas poderão ler aqui que a questão das notas demasiado generosas, tendo em vista também e sobretudo o acesso o ensino superior, são escrutinadas com atenção pelo Ministério da Educação. Falta no entanto apurar se, tal como os políticos em relação aos eleitores, os docentes enfeitam a realidade só para iludir os alunos e os encarregados de educação, ou se afinal se andam também a iludir a si próprios, procurando com tais práticas maquilhar uma realidade cada vez mais desagradável, que se recusam a enfrentar.

(Peço desculpa pelo mau aspecto do quadro. Nunca aprendi a fazer tabelas, porque nunca tive aulas de informática. E agora também já é um bocadinho tarde, porque entretanto aparecerá certamente uma forma de fazer quadros, sem necessidade de programas complexos.)




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