segunda-feira, 1 de janeiro de 2018

Os tomarenses e os seus notáveis

7 - Dr. Raul Lopes, um empresário cultural



No jardim da praceta com o seu nome, frente ao edifício que mandou edificar para sede do seu colégio, está a estátua de homenagem ao Dr. Raul António Lopes, natural de Ansião, licenciado em Matemática pela Universidade de Coimbra, que fundou e dirigiu o Colégio Nuno Álvares.
O estabelecimento de ensino, que funcionava em regime de internato e  externato, teve instalações na cidade antiga, nuns prédios onde está agora a sede da Misericórdia, bem como no ex- Grande Hotel, que anos antes falira, ao fundo da Várzea grande, entre a Rodoviária e a ARAL.
Nos anos cinquenta mudou-se para as novas instalações, edificadas para esse fim, tendo prosperado enquanto não houve ensino liceal público em Tomar.
Chegou a ser um dos mais conceituados colégios privados do país, com três categorias de alunos: A- Em regime de externato, os de Tomar e da região próxima, cujas famílias podiam pagar as respectivas propinas, e que não tinham escolha, porque naquela época só havia ensino liceal público em Santarém e Leiria. Em Tomar apenas ensino técnico, na Escola industrial e comercial Jácome Ratton, na Av Cândido Madureira; B - Alunos internos da então metrópole e do então ultramar, cujas famílias confiavam na qualidade do ensino ministrado no Nun'Álvares; C - Os maus filhos de boas famílias, que para aqui vinham praticamente em regime de desterro, funcionando o colégio como uma espécie de colónia penal para adolescentes difíceis
Duas peças do anedotário local permitem perceber a atmosfera da época no referido estabelecimento de ensino, onde, ao que consta, escasseavam a comida e a liberdade. Ambas as estórias são protagonizadas  por um dos prefeitos, aqueles empregados polivalentes que agora são designados com "auxiliares de acção educativa". Com uma notável diferença: na época os ditos prefeitos, entre outras tarefas, também vigiavam as horas de estudo acompanhado, actualmente a cargo de professores, nos estabelecimentos públicos.
Segundo o antigo aluno A. Caiano Silvestre, a dada altura um dos prefeitos endereçou ao Dr. Raul Lopes a seguinte participação:
"Exmo senhor Director
Comunico a Vª Exª que me roubaram meia dúzia de laranjas mais ou menos sete ou oito.
Desconfio de dois alunos mas esses não foram de certeza porque estavam no meu estudo."
O mesmo prefeito, avisando os alunos mais avessos à disciplina:
-"Os meninos ficam avisados que se forem para o Açude de Pedra ao banho e morrerem afogados no rio quando voltarem ao colégio ficam de castigo." Nem mais!
Sinal dos tempos, retrato da cidade e do país que somos, apesar de todos os esforços na net, não foi possível saber quem encomendou a estátua, quem a esculpiu, nem a data em que foi inaugurada. Como diria uma conhecida animadora da nossa tv, "Isso agora também já  não interessa nada."

1 comentário:

  1. Estranho não haver aqui um comentário sobre esta personalidade emblemática (e carismática) da cidade.
    Como operário das Artes Gráficas (8 anos) até assentar praça, tive o privilégio de manter contactos diretos frequentes com o Dr. Raúl Lopes. Enquanto empregado da Tipografia Nabão tinha a honra e o prazer de ser o impressor da Revista do colégio e, mais tarde, na Tipografia Progresso. Chapa pronta para cada página, deslocava-me ao colégio com as respetivas provas para que ele as revisse. Não abdicava do papel de revisor rigoroso.
    Regressado da guerra colonial, perante a crise que assolara o setor, baixos salários, e já com o curso geral do comércio tirado na Jácome Ratton (que é feito do Dr. Júlio das Neves?), decidi, com pena, mudar de vida. A oferta de emprego na cidade era nenhuma. Decidi pedir emprego ao Dr. Raúl Lopes. Admitiu-me como coordenador da revista e outras tarefas não especificadas. Entretanto fui admitido nas FMGodinho (setor exportação). Cometi a vil indelicadeza de nunca o informar do novo rumo que tomava. Indesculpável.
    Lembro-me também de o famoso forcado, Manuel Faia, tido como o primeiro a fazer uma pega de costas (há versões diferentes) ser prefeito no CNA, o que espelhava bem a Regra do estabelecimento e a de alguns dos seus alunos problemáticos.
    Por falar em Artes Gráficas, ao tempo uma indústria importante na cidade, sugiro à CMT que a homenagei na pessoa de um dos seus profissionais mais famosos; o Sr. Alberto ("Gazeado"), Mário Morais (já falecido), Jacinto Graça, Mário Gonçalves ("Catorze), O Sapatinha, etc., dando a uma rua o nome de um deles. Optaria por um destes dois: Mário Catorze (um artista) ou Sapatinha.
    Recordar é viver.

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