segunda-feira, 17 de abril de 2017

Tal deputado, tal jornalista...

"Quanto à saída do euro, João Oliveira explicou de que forma o país deve proteger-se da “submissão” à moeda única, admitindo que os “interesses particulares” dos “grandes grupos económicos” serão “sacrificados” com uma eventual saída. Sobre a renegociação da dívida, o líder parlamentar do PCP citou os exemplos “bem-sucedidos” da Argentina e do Equador e sugere, a título de exemplo, as vantagens de uma aproximação de Portugal à Rússia e aos restantes BRIC [Brasil, Rússia, Índia, China]."



Este excerto de uma recente entrevista ao Observador on line, que pode ser lida aqui, do líder da bancada do PCP na Assembleia da República, João Oliveira, é um exemplo perfeito do tipo de política argumentada que, infelizmente para todos, ainda se pratica no nosso país. A renegociação da dívida foi "bem sucedida" no Equador e na Argentina, avançou o brilhante parlamentar e político profissional.
Por mero acaso, ou talvez não, (a menos que seja simplesmente falta de informação pessoal, o que seria grave), esqueceu-se de um detalhe importante, sobretudo quando, como é o caso do seu partido, se defende a saída de Portugal do Euro. É que, desde o início deste século, há 17 anos portanto, a moeda nacional no Equador é... o dólar norte-americano!E quando um país usa a mesma moeda na qual estão titulados os empréstimos estrangeiros, é óbvio que a respectiva renegociação só pode correr bem, desde que a iniciativa parta dos credores e não, como pretendem fazer crer o PCP e o BE, do Estado em débito. Quanto à Argentina, seria demasiado longo demonstrar aqui o logro do jovem deputado. Digamos que ainda hoje há sequelas sérias do défault argentino de 1999-2000 e da negociação que se seguiu.
Pelo que não se entende de todo a argumentação do parlamentar comunista: O Equador foi bem "sucedido" porque entrou de facto para a "zona dólar USA", mas Portugal tem de sair da "zona euro", para obter o mesmo resultado? A Argentina foi bem sucedida, quando afinal, 17 anos passados, ainda tem problemas sérios com alguns fundos abutres?
Perante isto, que é uma enormidade política, o jornalista calou-se. Aceitou passivamente. Não foi documentar-se sobre o Equador e a Argentina. Contribuiu assim para induzir em erro os leitores. Tal deputado, tal jornalista. 
Todos falhamos, mesmo os melhores. Mas assim vai ser muito difícil sair da cepa torta.

5 comentários:

  1. Recomendo-lhe a leitura urgente do livro "O EURO", escrito pelo insuspeito ignorante Joseph Stiglitz, Prémio Nobel da Economia.
    Esse espírito alérgico precisa de ser arejado.

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    1. Agradeço o seu comentário e aproveito para o cumprimentar, desejando-lhe saúde e boa disposição.
      Indo ao fulcro da questão, como bem sabe não padeço felizmente de qualquer alergia. Limitei-me a abordar um caso concreto, que me parece assaz claro. Quanto ao Nobel Stiglitz, ilustre colunista do NYT e também professor, ainda não me constou que tenha defendido o caso equatoriano ou os resgates argentinos.

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    2. Leia e depois, fundamentado, bote espicho.
      Pratique o que aconselha e tantas vezes criticou aos outros por não fazer.
      São quase 500 páginas, mas leem-se bem.
      E Stiglitz é um insuspeito keinesiano, mas que pensa pela sua cabeça.
      E explica e escreve bem.

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    3. Tenciono ler o livro logo que possível. Quando for a Coimbra, vou procurá-lo na FNAC. Mas não se iluda, Virgílio. Stiglitz é mais um americano a quem o euro incomoda e que vive numa economia muito mais liberalizada que a portuguesa. Se os chineses resolvem pedir o reembolso da dívida americana que detêm, os USA entram em falência. E Pequim pode fazê-lo a qualquer momento porquanto tem outra moeda de reserva -o Euro, daí a azia de Stiglitz e de tantos outros americanos. Praticamente desde o início, em 2001, que andam a vaticinar o seu próximo colapso, e afinal já lá vão 16 anos...

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  2. Stiglitz fundamenta muito bem as suas opiniões, numa linguagem simples, acessível, que desmistifica os jargões neoliberais.
    E olhe que nem todos os americanos são Trumps ou aparentados, pelo menos em certos meios académicos.
    Mas não julgue que não tenho sempre o led aceso, pelo facto de ele ter sido conselheiro de Clinton.
    Mas creio que nunca o voltaria a ser.
    Ganhou carta de alforria, independência económica e intelectual. E isso faz toda a diferença, como fez com o já saudoso Baptista Bastos (para mim, claro está.)

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