quarta-feira, 29 de março de 2017

Pôr o carro à frente dos bois - 1

A Câmara aprovou, na reunião de 27 de de Março, o Estudo prévio para a requalificação da Várzea grande. Deliberou igualmente submeter o documento à discussão pública durante 15 dias, para cumprir a norma europeia. Pedro Marques considerou que era pouco tempo, mas Anabela Freitas foi taxativa. Garantiu que não há tempo para mais, por causa do PEDU, cujas candidaturas terminam em 31 de Maio. O PEDU é o acrónimo de Plano Estratégico de Desenvolvimento Urbano, financiado por fundos europeus. O costume.
Apesar das várias leituras do citado estudo prévio, que mão amiga me fez chegar, continuo cheio de dúvidas e até bastante preocupado. Basicamente, não consigo entender como é que a prevista requalificação da Várzea grande, nos moldes em que é proposta, pode contribuir para o desenvolvimento urbano. Cheira-me a mais uma obra do tipo Rotunda Alves Redol/varandas para o rio, do tempo do Paiva. O futuro o dirá.

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Mas regressemos ao princípio. O documento que li mostra tão pouca qualidade que sou praticamente forçado a dividir a respectiva análise crítica em dois textos. No primeiro, este que está a ler, falarei unicamente da forma. No segundo, a publicar amanhã, ocupar-me-ei da substância.
Quanto à forma, é meu entendimento que o citado estudo ganharia, caso fosse agora confiado a quem saiba e esteja habituado a escrever com correnteza, para o reformular. Única forma, julgo eu, de evitar futuros enxovalhos desnecessários. Digo isto, não por má vontade, pois nem sequer sei de quem é a autoria, se individual ou partilhada. Sei, isso sim, que padece de maleitas várias, que posso resumir em problemas de vocabulário, problemas de construção frásica e problemas de estrutura textual. Passo a exemplificar:
1 - Exemplo de um problema de vocabulário: ..."para a realização da feira anual ou do mercado sanzonal" (Página 4, final do 1º parágrafo do ponto 3). O termo sanzonal não existe, sendo a palavra correcta "sazonal". Além disso, um mercado nunca pode ser sazonal. Em conformidade com os usos e costumes, apenas diário, semanal, quinzenal ou mensal. A partir daí passa a ser feira, que essa sim é sempre sazonal, que é como quem diz, sempre numa determinada estação do ano.
2 - Outro exemplo de problema de vocabulário: "Da mesma forma será tratado o pelourinho" (Página 14, 4º parágrafo). Como toda a gente sabe, na Várzea grande nunca houve nem há qualquer pelourinho. O que lá está é um padrão ou obelisco filipino, (como de resto é referido noutras partes do documento), que até ao final da primeira metade do século passado esteve onde agora se encontra a estação rodoviária. O pelourinho está do lado norte do Centro histórico, à esquerda de quem vai para a Estrada de Leiria.
3 - Exemplo de problema de construção frásica: "Saliente-se que o modo para avaliar a qualidade de vida de uma cidade, implica desenvolver uma análise qualitativa dos  seus espaços exteriores e dos seus elementos estruturais. (Página 3, 2º parágrafo) Conseguiu perceber algo? Eu não. E tenho pena, porque já reli várias vezes.
4 - Exemplo de problema de estruturação textual: O capítulo 5 refere "Programa da intervenção", mas o capítulo seguinte tem por título "Plano de acessibilidade pedonal proposto". No meu entendimento de leigo na matéria, o referido plano não pode deixar de integrar o programa da intervenção, pelo que o desdobramento feito apenas complica, carecendo de justificação.
Os exemplos apresentados são apenas uma amostragem sucinta das carências gritantes do documento em questão, quanto à forma como está escrito. Há parágrafos inteiros de entendimento muito problemático.
Provavelmente, muitos outros documentos do mesmo tipo padecerão das mesmas mazelas, pois é sabido que, não raras vezes, os licenciados técnicos, não dominam quanto baste os conteúdos básicos da área das letras.  Em qualquer caso, reitero que seria de toda a conveniência corrigi-lo em tempo útil, visando evitar futuros dissabores. Por um lado, porque com o mal dos outros pode a gente muito bem, pelo que eventuais outros documentos aleijados não justificam de modo algum as óbvias deficiências deste. Por outro lado, porque muito dificilmente um documento medíocre pode dar origem a uma obra de excelência, como se pretende. Ou trata-se apenas, e mais uma vez, de sacar fundos europeus de qualquer maneira, antes que outros os levem?

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