domingo, 12 de março de 2017

Os tomarenses ainda confiam no sistema partidário?

Num comentário que pode ser lido aqui, relacionado com o mau momento dos Independentes por Tomar, Templário (leitor devidamente identificado), sustenta que "Apesar de tudo, o nosso sistema partidário ainda merece a confiança dos portugueses." Não comungando de tal opinião, logo após ter lido a afirmação, fiquei pensando se a situação será semelhante em todo o país, ou se estamos perante uma natural divergência de pontos de vista. Porque a mim me parece que os eleitores confiam cada vez menos nas formações partidárias que temos. Como de resto vem acontecendo por essa Europa fora, designadamente em Espanha, em Itália, na Grécia, ou agora em França, de forma mais ou menos acentuada.
Não dispondo de meios para analisar a situação a nível nacional, fui procurar uma resposta factual, no que concerne ao concelho de Tomar. Consultei uma vez mais os resultados eleitorais oficiais, entre as autárquicas de 2005 e as presidenciais de 2016. De cada uma dessas eleições extraí o trio abstenção + votos nulos + votos brancos, de forma a obter a percentagem total de eleitores que de facto não escolheram, o que equivale a não votar. Eis os resultados:

                                    2005              2009                 2013                 2016

Abstenção..................38,99%..........41,21%.............47,70%.............48,36%
Voto nulo.....................2,47%............2,02%..............4,19%................1,26%
Voto branco.................3,67%............2,62%..............4,73%................1,38%
% total.......................45,13%..........46,43%............56,62%..............51,00%

Temos assim que, entre 2005 e 2016, no concelho de Tomar, a abstenção aumentou 9,37%. Passou de 38,99% para 48,36%.  Mais grave ainda, entre 2005 e 2013, a percentagem total de eleitores que não votaram e/ou não escolheram, aumentou de 45,13% para 56,62%, um incremento de 11,49% em apenas oito anos. Durante esse mesmo período, os votos brancos e nulos aumentaram também consideravelmente, ultrapassando ambos os 4%, algo pouco comum e que traduz desânimo perante as opções propostas.
Vistos de outro ângulo, os resultados das autárquicas de 2013 podem até considerar-se alarmantes no concelho tomarense. Com efeito, a abstenção total (abstenção + votos nulos + votos brancos) só não ultrapassou os quase 57%,  porque entretanto apareceu uma nova formação política, o MPT, que concorreu pela primeira vez e conseguiu 6,98% = 1.369 votos. Sem esta novidade, imagine-se o que poderia ter sido.
Mesmo com o aparecimento brusco dessa nova formação, entretanto também já desacreditada a nível nacional, a legitimidade factual do poder nabantino está longe de ser brilhante. A relativa maioria que nos vai tentando administrar (PS + CDU) representa apenas 36,7% dos votos = 7.306 eleitores, de um total de 37.310 inscritos. Fernando Pessoa previu tal desastre. Escreveu em 1923 que "A nossa crise política é o sermos governados por uma maioria que não há." Então como agora.
A demonstrar que tais resultados traduzem sobretudo o descontentamento da população tomarense perante o sistema partidário que temos, nas presidenciais de 2016, afinal uma eleição parcialmente despartidarizada, os votos brancos e nulos diminuíram para menos de metade e a percentagem final de abstencionistas de facto, baixou 6,62%, em relação às autárquicas de 2013.
Será isto uma prova de que "o nosso sistema partidário ainda continua a merecer a confiança dos portugueses", neste caso dos tomarenses? Ou mostra, pelo contrário, que em Tomar estamos mesmo muito mal servidos de partidos e por isso cada vez menos confiantes?
A opinião é livre, mas os factos são o que são.

Adenda
Deseja ler a obra da qual foi extraída a citação de Pessoa? Pois faça favor: Fernando Pessoa, Ultimatum e páginas de Sociologia Política,  Lisboa,  Ática, 1980 - 3

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