terça-feira, 21 de março de 2017

O cadáver IpT e as ilusões dos abutres

É humano, sobretudo em política. Com o evidente esfrangalhamento dos IpT, tanto os dirigentes socialistas tomarenses quanto os social-democratas, tendo em vista as futuras autárquicas, procuram tirar o máximo proveito possível  dos despojos da quase defunta formação.  Para já, Anabela Freitas está convencida de que levou a melhor. Conseguiu o que considera ser o "bife do lombo", como se diz aqui pelo Brasil. Pode porém estar equivocada, coisa que só se apurará uma vez contados os votos, dentro de alguns meses. Até lá, existem contudo alguns elementos que permitem uma análise com hipóteses de sucesso. Vejamos.
Antes de mais, há que ter em conta a principal causa do desmoronamento dos IpT. Quaisquer que venham a ser as variadas justificações dos seus elementos, desiludidos ou nem tanto, tenho para mim e já o escrevi antes, que a queda final resulta de um único factor -a evidente ausência de um projecto sólido, adequado e mobilizador. Na verdade, desde a saída de Fernando de Oliveira (por motivos nunca cabalmente explicados), e mesmo quando Rosa Dias ainda integrava o grupo, era já óbvio que na prática a única folha de estrada se resumia às ideias de Pedro Marques. Um projecto unipessoal. Por isso, ao cabo de 12 anos, aí está a hecatombe final. Na política, não é possível navegar à vista durante muito tempo. Sobretudo quando provadamente o piloto vê mal ao longe.

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Intimamente exultantes com o malogro alheio, procurando até recuperar, conforme já referido, alguns dos respectivos despojos, PS e PSD agem como as aves necrófagas,, não se dando conta de que navegam no mesmo mar e nas mesmas condições, pelo que podem muito bem vir a naufragar mais cedo ou mais tarde, exactamente pelas mesmas causas Tanto mais que, se os IpT se afundaram à míngua de ideias fecundas e estruturadas, não consta que as outras formações estejam em melhor posição nessa área. Por essa Europa fora, não faltam exemplos de grandes formações que implodiram. (Pasok grego,  PC e PSOE em Espanha,  PC e PS em França, PC, PS e Democracia Cristã em Itália). De forma que, numa cidade pequena, com um universo de 36 mil eleitores inscritos, os desastres podem até vir a ser mais repentinos. E essa balela, posta a circular pelo pessoal amador da gerigonça, segundo a qual os socialistas só perdem influência quando se aliam  à direita, não passa disso mesmo, uma balela vesga, para tentar enganar eleitores trouxas. Porque em França, em Espanha ou na Itália, por exemplo, os socialistas não se associaram à direita. E no entanto... François Hollande, o presidente francês em fim de mandato, está com 4% de opiniões favoráveis. Caso para  no mínimo António Costa começar a encarar as coisas de outro modo, parece-me a mim.
Mas voltemos a Tomar. Quando daí saí, a percepção que havia no seio de alguma população esclarecida era extremamente perigosa para todos os integrantes do executivo, excepto para a CDU. Isto porque era então voz corrente que: 1 -  O PSD teve quatro mandatos muito criticáveis, sobretudo os dois últimos, mas não aprendeu nada, continuando sem qualquer plano de acção estruturado e estruturante; 2 -  O PS habituou-se a criticar os anteriores mandatos, mas a experiência mostra que também se limita praticamente a despachar os assuntos correntes, carecendo manifestamente de qualquer projecto digno desse nome. Sacar dinheiro aos contribuintes não é propriamente muito entusiasmante para o eleitorado. E alojar famílias ciganas também não, excepto para os beneficiários, como é óbvio. 3 - Ninguém entendia o papel de Pedro Marques no executivo, entalado entre o PSD e a CDU, mas sem nunca se definir. Numa frase: Em Dezembro passado, o eleitorado urbano tomarense não via qualquer diferença notável, em termos de opções a médio prazo, entre o PS, o PSD e os IpT. Agora que os IpT já estão em agonia, muito dificilmente remediável, estarão as outras duas formações que realmente contam livres de percalços semelhantes? Não vejo porquê. Pelo contrário. O eleitorado terá cada vez mais dúvidas perante a alternativa que lhe é proposta: Blazer às riscas rosa e laranja (PS)? Ou blazer às riscas laranja e rosa (PSD)?
Creio portanto que uma de duas: Ou cada uma das candidaturas trata de se apresentar com um programa robusto, bem explicadinho, adequado, e visivelmente diferente dos outros, ou poderemos vir a ter um desastre eleitoral de proporções inéditas. Basta recordar os 47% de abstenção, e sobretudo os 8,92%  de votos brancos e nulos, em 2013. Em termos políticos, praticamente ontem. 
Para quem considere que esta análise é injustificadamente alarmista, copiei este excerto de Alexandre Homem Cristo, no Observador online de 20/03/17: "A direita partidária há muitos anos que deixou de ter um projecto político com identidade e, no lugar, aceitou calçar as luvas de bombeiro do regime. Só intervém para apagar os incêndios nas contas públicas e, nos intervalos, vai apontando o dedo aos pirómanos. Foi assim com o pântano de Guterres e a bancarrota de Sócrates. É assim hoje -e isso não chega."
O caso tomarense é mais grave. O incêndio não é só nas contas públicas. O bombeiro Boavida é capaz de abalar a fugir Corredoura abaixo, se lhe disserem que é de direita, e o PS até o convidou para 2º da lista em 2013. Ou seja, o cabeça de lista do PSD, também podia, sem escândalo nem oposição, encabeçar a lista PS. O que mostra bem a açorda política que por aí vai, nas margens nabantinas.
Por tudo isto, se não aparecerem programas clarificadores e mobilizadores, não sei não! Mas posso estar enganado. Praticamente, ignoro tudo de transumância política. Não passo afinal de uma ovelha ranhosa, impopular porque alérgica a rebanhos. Só tenho um elemento a meu favor - já cá ando há muitos anos.

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