sexta-feira, 23 de dezembro de 2016

IMPROVAVELOGIA

Afinal só há dinheiro sujo

"Depois de ler esta crónica, você é bem capaz de começar a olhar de soslaio para o seu gestor de conta (se ainda não era o caso), para o Multibanco, para o mealheiro, ou mesmo para a sua carteira. Porquê? Porque todos eles são potenciais difusores bacteriológicos perigosos. Por causa do dinheiro que, mesmo se foi ganho honestamente, é sempre dinheiro sujo, biologicamente falando. Que o paranoico, o misófobo ou o nosófobo que há em si, mesmo sem você disso se aperceber sequer, se entretenham a refazer mentalmente o percurso de toda essa massa, que passa de mão pouco limpa para outra mal lavada; de uma carteira colocada no bolso junto ao sovaco, para outra no bolso das calças; da caixa de um protólogo para a de um negociante de tripas, antes de vir parar às suas mãos...
"Vector passivo de contágio", tal é a terminologia oficial para designar objectos cuja superfície pode ser contaminada por patogénicos. E o graveto é um deles. Tanto as notas grandes como as pequenas, de acordo com um estudo franco-saudiano publicado em 2014, na revista Future Microbiology. Os seus autores fazem a síntese de toda a literatura biomédica consagrada à capacidade das espécies (no sentido monetário do termo), para darem boleia aos micróbios. Diga-se a propósito que essa questão não é nova, pois o texto até menciona um estudo de 1924 intitulado "Papel-moeda sujo".
Mergulhemos então na análise do arame e digamos frontalmente que nada é poupado: mesmo se o cobre, muito frequente nas moedas, limita o número de micro-organismos, mesmo se as notas em plástico, já em circulação na Austrália e Nova Zelândia, são mais "higiénicas" que as de papel, a ciência demonstra que o dinheiro acaba sempre por ser contaminado. Sobretudo as notas em papel. Existem diferenças, consoante os países, porém, entre os exemplos citados no referido estudo, nunca se desce abaixo dos 80% de notas sujas, com um extraordinário 100% para as notas ganesas analisadas.


Resultado de imagem para notas banco

O total de 100 bactérias por centímetro quadrado não é raro, todavia o record nessa matéria pertence a algumas notas birmanesas com 10 milhões de bactérias nessa mesma superfície, entre as quais muitas de origem fecal. A tal ponto que até cabe interrogar-se se alguns não terão confundido as notas com papel higiénico.
Que encontramos nesse autêntico viveiro de micro-organismos? Nos 17 países e regiões auscultados (da Europa aos Estados Unidos, passando nomeadamente pela Índia, China, Nigéria e Canadá), há de tudo, por assim dizer. A célebre bactéria intestinal Escherichia coli, o estafilococo dourado, salmonelas, estreptococos, enterococos, fungos, ovos de ténia ou de ascaris. No Bangladesh até se encontrou a bactéria na origem da cólera, em notas obtidas junto de vendedores de legumes, de carne e de peixe...
O estudo acentua que a transmissão de bactérias e de virus por intermédio das notas de banco é possível entre humanos. É portanto indispensável lavar as mãos sempre que se tocou em dinheiro, sobretudo se lhe pagaram para preparar comida ou para tratar de uma cárie.
Os leitores que, preocupados com a higiene, queiram passar rapidamente à tecnologia de pagamento sem contacto, e desfazer-se rapida e definitivamente das notas de banco, vectores de graves doenças, podem enviá-las em envelope fechado e lacrado para" Tomar a dianteira, Rua Dª Aurora de Macedo, 73, 2300 -556 Tomar Portugal. Mesmo as notas mais sujas.
Não têm nada que agradecer! Eu é que fico muito grato.

Pierre Barthélémy, Le Monde, Science & Médecine, 21/12/2016, pág. 6
Tradução e adaptação de António Rebelo

Esclarecimento
Como decerto já intuiram aqueles leitores capazes disso, trata-se de um texto rigoroso mas irónico, de uma ironia fina, hoje em dia cada vez mais rara. Infelizmente, pelo que isso significa.
A parte final, que está fora das aspas e do itálico, é minha. Substitui o que consta do original: "o autor destas linhas, 80, Boulevard Auguste Blanqui, 75013 Paris." É o endereço da redacção do Le Monde.
Como é óbvio, tratando-se de mera ironia, não estou de modo algum a tentar ludibriar os leitores. Dito isto, para ficar de consciência tranquila, o que em Tomar não é coisa fácil, pelas razões que todos conhecemos, se está preocupado com a sua saúde e tem por aí algumas notas contaminadas, das quais queira desfazer-se e não saiba como...Tomar a dianteira 3 agradece a atenção natalícia.
Um bom Natal para todos! (Mesmo para os meus inimigos, que sei serem numerosos, porque a verdade magoa quase sempre e eu recuso-me a ser hipócrita.)

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