segunda-feira, 22 de fevereiro de 2016

O castelo data de 1160? Ou de 1130?

Pode parecer um dúvida de pacóvio, mas não é. Conforme se sabe,  quando há dúvidas em História, deve seguir-se o mesmo caminho que quando se tem sede -procurar as fontes. Foi o que fiz esta manhã, acicatado por aquela mudança da Festa Templário de Maio para Julho, que considero uma asneira. Será assunto para outro texto.
No que concerne à história e mais precisamente à história do castelo templário, que é também a história de Tomar, a única fonte coeva (que é como quem diz da época) e por isso incontroversa, é aquela lápide que está do lado direito da escadaria de acesso à Charola:

A lápide original, em latim

                                                     A actualização em português arcaico

A lápide que está à direita é apenas a actualização para português arcaico da original, que está à esquerda e em latim.
Vários historiadores locais e outros estudiosos da questão já foram confrontados com uma incongruência. A data indicada na dita actualização para o início da fundação do castelo é 1168. À boa maneira portuguesa, arranjou-se logo uma explicação algo bizarra. Escreveram ou disseram que deve ler-se 1160 porque 1198 menos os 38 anos da era de César para a de Cristo,.. mas o canteiro se calhar era analfabeto, entendeu mal e gravou mal.
Acabo de dar-me conta que tal justificação não passa afinal de balela nabantina. Mais uma. Em boa verdade, na lápide original, a que está em latim e com "algarismos romanos" a data é mesmo 1168. (O leitor fará o favor de clicar sobre a primeira foto, para ampliar. Já está? Então agora repare nas primeiras letras: E:M:C:L:X:V:III = Era de Mil cento sessenta e oito). O canteiro que cinzelou a inscrição da direita não cometeu portanto qualquer erro. E mais ainda. Uma vez que na mesma lápide original figura a data de 1228 para o cerco do Al Mansor, que se sabe ter ocorrido em 1190, por causa dos tais 38 anos a menos, devido à alteração de era, temos portanto que o início da edificação do castelo foi em 1 de Março de 1130, pois seria uma incongruência usar na mesma lápide duas eras diferentes, uma para o início da construção do castelo, outra para o cerco pelas tropas do Al Mansor. Ou estarei a ver mal?
Aqui fica a dúvida, ao cuidado dos historiadores encartados e outros especialistas locais, que não são nada poucos, mas em geral só aparecem quando já não são precisos...

Adenda:

O leitor Simon enviou um esclarecimento, dizendo que o X de 10 tem a perna que se vê à direita torcida e por isso vale 40. Por conseguinte, 1198. Andamos sempre a aprender. Nunca tinha ouvido ou lido tal coisa. É o que eu digo: aqui em Tomar e no país em geral arranjamos solução para tudo. Menos para o défice, que continua a crescer. Infelizmente.

anfrarebelo@gmail.com

1 comentário:

  1. Boa tarde. O letreiro epigráfico mais antigo mostra efectivamente E:M:C:L:X mas o X é aspado ou seja a "perna" superior direita do X é diferente das outras, é uma "perna aspada" e o facto do X ter essa "perna" dá-lhe o valor de 40 e não de 10. Temos assim Era milesima centesima nonagesima oitava, os tais 1198 anos que descontados da Era de César dão-nos os tais 1160, data de início da construção do castelo de Tomar. Um dos melhores trabalhos sobre epigrafia medieval portuguesa é o estudo de Mário Barroca (862 a 1422). Está resolvido o mistério. Obrigado.

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